Israel mata cinco jornalistas da Al Jazeera em ataque perto do hospital Al-Shifa, em Gaza

Foto: Omar AL-QATTAA / AFP
Foto: Omar AL-QATTAA / AFP

Um ataque israelense atingiu na noite de domingo (10) uma tenda de imprensa montada junto ao portão principal do Hospital Al-Shifa, na Cidade de Gaza, matando cinco jornalistas da rede Al Jazeera, entre eles o repórter mais conhecido da emissora na região, Anas al-Sharif, de 28 anos.

Testemunhas e imagens verificadas por equipes de checagem mostram pessoas carregando os corpos das vítimas entre os escombros e chamas. Segundo a Al Jazeera, a equipe estava trabalhando na tenda, local frequentemente usado por repórteres em Gaza para ter acesso a eletricidade e internet, quando o local foi atingido.

Quem foram as vítimas

A emissora identificou os mortos como:

  • Anas al-Sharif, 28 anos, um dos rostos mais conhecidos da cobertura árabe em Gaza;
  • Mohammed Qreiqeh, 33 anos, correspondente;
  • Ibrahim Zaher, 25 anos, cinegrafista;
  • Mohammed Noufal, 29 anos, cinegrafista;
  • Moamen Aliwa, cinegrafista.

A Al Jazeera informou ainda que, no total, sete pessoas morreram no ataque,  a emissora havia atualizado o balanço horas depois de uma primeira contagem.

Versão israelense e reação internacional

As Forças de Defesa de Israel (FDI) disseram que o ataque teve como alvo Anas al-Sharif, acusando-o de atuar como comandante de uma célula armada do Hamas e de participar de ataques com foguetes contra civis e tropas israelenses. O porta-voz militar divulgou alegações e documentos que, segundo ele, provariam a ligação de al-Sharif com a facção militar.

Organizações de defesa da imprensa, contudo, classificaram as acusações como infundadas ou insuficientemente comprovadas. O Comitê para Proteção de Jornalistas (CPJ) declarou-se estarrecido e afirmou que Israel não apresentou evidências sólidas em apoio às acusações. A relatora especial da ONU para a liberdade de expressão, Irene Khan, qualificou as alegações como “infundadas” e considerou o ataque “um flagrante ataque a jornalistas”.

O editor-chefe da Al Jazeera chamou o ocorrido de “assassinato seletivo” e afirmou que os repórteres eram “umas das últimas vozes de dentro de Gaza” levando informação ao mundo, especialmente depois que o acesso de jornalistas internacionais ao território foi restrito desde outubro de 2023.

O ataque

Fontes da Al Jazeera relataram que a tenda foi atingida por um veículo aéreo não tripulado por volta das 23h35 (20:35 GMT). Testemunhas descreveram cenas de grande destruição: equipes tentaram socorrer e apagar o incêndio, mas alguns dos feridos não resistiram.

Vídeos e relatos repercutidos pelas agências mostram colegas tentando retirar os feridos e, em seguida, transportando os corpos. A BBC Verify, serviço de checagem da BBC, confirmou a autenticidade de imagens que registram o resgate e a retirada das vítimas.

Contexto e padrão denunciado

Organizações de direitos humanos e de defesa da imprensa alegam que o caso se encaixa em um padrão em que jornalistas em Gaza são mortos e posteriormente alvo de alegações por parte de Israel sobre vínculos com grupos armados, frequentemente sem que provas públicas e verificáveis sejam apresentadas. Desde o início da ofensiva israelense em outubro de 2023, centenas de profissionais de mídia foram mortos ou feridos segundo diferentes contagens: o CPJ registra dezenas de mortes confirmadas, enquanto autoridades de Gaza estimam números mais altos de jornalistas e trabalhadores de mídia mortos no conflito.

A situação mais ampla em Gaza também preocupa: além dos constantes bombardeios, há alerta internacional sobre fome em massa e restrições à entrada de ajuda humanitária. Organizações humanitárias e veículos de imprensa internacionais vêm denunciando as condições extremas enfrentadas por jornalistas locais, muitos dos quais, segundo relatos, têm dificuldade em conseguir alimentação e acesso a recursos básicos para trabalhar.

Consequências e investigações

A morte de al-Sharif e dos colegas gerou pedidos imediatos por investigações independentes e por responsabilização. Grupos de defesa da liberdade de imprensa exigem que as autoridades israelenses apresentem provas das acusações dirigidas contra o repórter e investiguem de forma transparente o ataque à tenda de imprensa.

O episódio intensifica o debate sobre a segurança de jornalistas em zonas de conflito e sobre o direito à informação num dos teatros de guerra mais vigiados do mundo. A ofensiva israelense foi deflagrada em resposta ao ataque do Hamas em 7 de outubro de 2023, que deixou cerca de 1,2 mil mortos em Israel e centenas de reféns, segundo relatos oficiais; desde então, o número de vítimas em Gaza ultrapassa dezenas de milhares, de acordo com o Ministério da Saúde do território.

A cobertura e o acesso à região permanecem severamente limitados, e a morte desses profissionais que atuavam como fonte essencial de informação para o exterior levanta novas preocupações sobre a possibilidade de monitoramento independente dos acontecimentos em Gaza.

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