Música contra a morte: Keith LaMar e Albert Marquès lançam álbum gravado do corredor da morte

Foto: Reprodução
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Em um contexto onde arte e ativismo se entrelaçam de forma visceral, o lançamento do álbum Live From Death Row representa muito mais do que uma nova produção musical. A obra é resultado da improvável, porém poderosa, parceria entre o pianista catalão Albert Marquès e Keith LaMar, um norte-americano condenado à morte que vive há quase três décadas no corredor da morte em Ohio. O disco, apresentado ao público em Nova York no último fim de semana, é o segundo trabalho da dupla, dando continuidade ao projeto iniciado com Freedom First (2022), que se tornou um movimento internacional em defesa de um novo julgamento para LaMar.

LaMar foi condenado em 1995 por sua suposta participação na morte de cinco presos durante a rebelião em Lucasville, uma das mais violentas da história dos presídios dos Estados Unidos. Na época, cumpria pena por um outro crime (o assassinato de um adolescente), e nega envolvimento com os homicídios na rebelião. Seu julgamento, segundo ele e diversos apoiadores, foi permeado por irregularidades: um júri totalmente branco, provas escondidas e testemunhos de outros detentos que teriam sido beneficiados com redução de pena em troca de acusações. “Fui condenado por ser negro e pobre”, declarou LaMar em diversas ocasiões. Investigações jornalísticas recentes corroboram parte dessas alegações.

O álbum Live From Death Row é uma expressão artística que transcende as paredes da prisão, trazendo à tona não só o talento musical de LaMar e Marquès, mas também uma mensagem contundente contra a pena de morte. O repertório mistura composições originais com releituras de clássicos do jazz que carregam peso histórico e político, como Strange Fruit, eternizada por Billie Holiday, e Alabama, de John Coltrane. As faixas expressam resistência, dor e esperança, transformando a voz de um condenado em instrumento de denúncia e diálogo com o mundo exterior.

Apesar das limitações impostas pela prisão, LaMar só pode participar das gravações por meio de videochamadas e mensagens de áudio. Albert Marquès, também professor no Brooklyn, conduziu a gravação com um grupo de músicos comprometidos com a causa. Para ele, o projeto não é apenas uma demonstração de solidariedade, mas um grito por justiça. “Precisamos de ajuda para levar essa luta a outro nível”, afirmou.

A execução de Keith LaMar está marcada para 13 de janeiro de 2027, após ter sido adiada pelo governador de Ohio, devido à recusa de farmacêuticas em fornecer os componentes necessários para a injeção letal. No entanto, um recente decreto do ex-presidente Donald Trump, que pressiona por métodos para viabilizar as execuções, reacendeu o alerta entre os apoiadores de LaMar. Até junho de 2025, 19 pessoas já foram executadas nos Estados Unidos, incluindo por métodos como fuzilamento e asfixia, em um sinal de endurecimento da política criminal no país.

O álbum, portanto, surge como uma tentativa de reverter um destino marcado, dando visibilidade a um caso que envolve questões raciais, falhas judiciais e o debate contínuo sobre a legitimidade da pena de morte. Para LaMar, o jazz tem sido seu refúgio e sua forma de resistência. “Esta música é sobre confiança e fé (…) sobre dar um passo à frente mesmo quando você não consegue ver a escada”, escreveu ele em mensagem à imprensa.

Live From Death Row é, acima de tudo, um apelo por humanidade. Um registro artístico de alguém que busca mais do que a liberdade: busca ser ouvido. E, ao fazer isso com tanta sensibilidade e força, Keith LaMar e Albert Marquès transformam uma sentença de morte em uma sinfonia de esperança e denúncia.

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